Crise político institucional, volta da recessão e impactos sobre o Maranhão

Publicado em 03/07/2017

* Artigo publicado no Jornal O Imparcial de 03-07-2017

 

A divulgação, no dia 17 de maio recente, da delação premiada de Joesley Batista, controlador do grupo JBS, constitui o que alguns dos analistas de mercado chamam de “Cisne Negro”, um evento de rara singularidade, de grande impacto sobre os negócios e que altera de forma radical a percepção e as previsões acerca do ambiente econômico. A implicação direta, nas investigações da Operação Lava a Jato, do Presidente Michel Temer e de alguns de seus mais destacados colaboradores, assim como do Senador afastado Aécio Neves, atingiram fortemente o comando dos dois grandes partidos que sustentam o atual governo -  O PMDB e o PSDB.

A perda de capacidade de aglutinação do Governo no Congresso Nacional coloca em cheque a condução das reformas que sinalizem a ancoragem da situação fiscal. Este fato alimenta a deterioração das expectativas empresariais, levando ao adiamento ou abandono de vários projetos de investimento. Observa-se também restrição  na concessão de crédito pelas instituições financeiras, que amplia a contração do investimento agregado, hoje incapaz de cobrir a depreciação da infraestrutura brasileira.

Alguns analistas apontam os confortáveis indicadores externos, a taxa de inflação em queda,  as contratações líquidas de emprego formal na indústria de construção e de transformação em maio, assim como os sucessivos cortes na taxa básica de juros Over-Selic, como indicadores de recuperação, como se a economia estivesse blindada em relação à crise político-institucional. Mas na verdade, este conjunto de indicadores favoráveis foi produzido principalmente pela brutal contração da demanda doméstica e pelo cenário externo favorável, e não pela retomada da confiança e dos investimentos.

Quando se observa a taxa de juros real ex-ante (inscrita nas cotações dos títulos da dívida pública de um ano), percebemos que a taxa de juros real, em contexto de deterioração das expectativas e aumento dos prêmios de risco, vem se elevando, com inevitável impacto sobre as atividades. Ou seja, o Cisne Negro fez o país abortar o ensaio de recuperação e deverá retomar uma trajetória recessiva, com novas rodadas de elevação das taxas de desocupação. Em algum momento (muito próximo), não há dúvidas de que a volta do cenário recessivo retroalimentará a crise político-institucional.

No caso da Economia maranhense, foram realizados testes de stress, no sentido de antecipar os piores impactos possíveis advindos da provável retomada da trajetória recessiva, que deverá levar a uma nova queda do PIB em 2017, embora de proporções modestas (-0,5%). Este cenário de stress prevê frustração de receitas advindas das transferências federais, da ordem de R$ 1,0 bilhão para o Governo do Estado em 2017 e 2018 (no plano municipal deverá haver frustração de receitas de montante semelhante), havendo também risco de que obras federais em andamento no Estado, no valor de R$ 443 milhões, sofram atrasos e descontinuidades. Outro front que deve ser afetado é o canal da concessão de financiamentos imobiliários, que registou apenas R$ 109 milhões no primeiro quadrimestre, comparado a mais de R$  1 bilhão em 2014. Há também sinais de que grandes projetos de investimentos, em estágio de estudos  técnicos, negociações de contrapartidas e licenciamentos, possam ter a fase de implantação adiada.

É importante frisar que, em contraste com a maioria dos demais estados da federação, há um conjunto de investimentos públicos e privados no Estado do Maranhão, que deverão se manter e que exercem um papel contra cíclico nesta difícil conjuntura. Tais investimentos, financiados pelo Tesouro Estadual e BNDES, somam $ 1,83 bilhão, distribuídos entre a infraestrutura de transportes, educação, saúde, segurança, saneamento e assistência social. Há também projetos privados que se mantem,  seja porque em fase de conclusão (duplicação da ferrovia da Vale), seja porque beneficiários de demanda externa firme e/ou desvalorização cambial recente. Este é o caso dos investimentos no Porto de Itaqui (R$ 1,7 bilhão), da unidade de pelotização da Vale e da ampliaçao da Suzano Papel e Celulose.

O mercado de trabalho formal maranhense registrou 768 contratações líquidas em maio recente, melhor resultado para o mês desde 2012. No acumulado do ano até maio, o fechamento liquido de vagas de emprego formal reduziu-se a 6 mil, contra com 13,1 mil demissões, no mesmo período de 2016. Destacam-se as atividades sucro-alcooleiras, as obras de infraestrutura e a geração de vagas na administração pública, enquanto que o subsetor comércio continua demitindo fortemente no Estado.

Trata-se de um cenário difícil, que exige cautela, para evitar desequilíbrios fiscais que possam ameaçar a continuidade dos investimentos e também a cobertura da folha salarial e dos fornecedores. Mas também um momento favorável para se construir as bases para o próximo ciclo de crescimento, tarefa que pressupõe a capacidade de planejar territorialmente em longo prazo, com destaque para as prioridades na infraestrutura e também para a exploração das fontes de financiamento públicas e privadas não aproveitadas em governos anteriores, a exemplo dos fundos constitucionais, das instituições multilaterais, dos fundos verdes e dos bancos de fomentos dos países dos parceiros investidores no Estado.

*Felipe de Holanda é presidente do Instituto de Maranhense de Estudos Socioeconômicos (IMESC). Professor licenciado do Departamento de Economia da Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Foi Presidente do Conselho Regional de Economia do Maranhão – CORECON-MA. Graduou-se em Economia e em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo (USP), em 1990 e 1991, concluiu o Mestrado em Economia no Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) em 1997. Doutor em Políticas Públicas ( UFMA).